quinta-feira, 17 de abril de 2008

Baba Slava

Eis que estávamos na noite de ontem, dia 16 de abril, comemorando o aniversário do meu pai com um jantar em família num dos nossos restaurantes preferidos em São Paulo, quando o celular do aniversariante toca. Do outro lado da linha, seu irmão, que ainda não havia lhe dado os parabéns, diz: “a mamãe morreu”.

Silêncio.

Primeira frase do meu pai: “minha mãe não pode fazer isso comigo!”

Em seguida, um choro sentido e soluçado. Depois, um brinde com uma taça de vinho, bebida dileta da minha avó. Mais choro. Mais brinde. Mais choro. Mais brinde. Até que era chegada a hora de sair correndo dali.

Na minha mente, um único pensamento, expresso apenas posteriormente: minha avó materna faleceu no dia do aniversário da minha irmã, e agora minha avó paterna morre no dia do aniversário do meu pai. Tudo bem que datas são apenas datas, mas que esse negócio está esquisito, está. Fico pensando se as véinhas chegaram a fechar um acordo quanto a isso!

Passado o susto, o dia 17 foi de despedida da vó Slava, como era chamada por seus netos a Sra. Miroslava Dragojevic Bosko Gerbovic (quando eu era criança, minhas amigas brincavam de decorar o nome da minha avó).

Com 89 anos, Miroslava (glória e paz em croata) nasceu no fim da I Grande Guerra na Vela Luka, uma ilha então pertencente à Iugoslávia, hoje croata.

Filha de Ivan Dragojevic Bosko e Marija Dragojevic Bosko (sabe que não sei o nome de solteira da minha bisavó?), veio para o Brasil acompanhada dos pais e das 2 irmãs e irmão mais velho em 1925.

Chegaram numa terra desconhecida, sem falar uma palavra de português, e foram tratados no início quase que como escravos numa fazenda localizada no interior de São Paulo. Meu “dida” (avô em croata, apesar de eu me referir ao meu bisavô), poeta conhecido como Veli Ivan (Grande Ivan), narrou toda a trajetória da Vela Luka ao Brasil em poemas. Uma pena eu não ter conhecido esse bisavô, pois tenho a impresão de que seríamos bons amigos.

Uma vez na capital do estado, junto com outros iugoslavos, minha avó se viu obrigada a trabalhar desde cedo. Teve inclusive o documento civil alterado pelo próprio pai, para poder trabalhar, ainda que fosse uma criança.

Apesar da vida sofrida, teve muito carinho dos pais, cresceu muito amiga dos irmãos, riu e fez rir, pois sempre foi a “palhaça” da turma.

Logo após perder o pai, casou-se com Ivan Gerbovic, pois já tinha quase 30 anos e ele era simpático. Essa era a minha avó: extremamente sincera.

Com ele, teve 3 filhos, os quais lhe deram 8 netos, dos quais 1 lhe deu duas bisnetas, as quais ela não chegou a conhecer. Podemos dizer que deixou várias marcas no mundo.

Gostaria, porém, de elencar as marcas deixadas na minha memória pela minha avó:

- Maria-mole
- lasanha e batata frita
- muitas risadas e palhaçadas
- Bíblia Sagrada, santinhos, imagens de Cristo na cruz
- reza do terço em croata
- cabelos brancos arroxeados
- unhas sempre feitas
- irritação por não chegarmos às 12h00 em ponto para o almoço de domingo
- bingo
- frases como “estou com ânsia de gômito”, “a sereia da imbulância não parou de tocar”, “a fulana tem creme (leia-se crânio) mole”, “a Marinoca tirou o pênis (leia-se apêndice)”, “não gosto que cachorro me lembe”, “eu falo errado porque estudei na Europa”, quando o certo seria “eu falo errado porque nunca estudei” (logo ela, filha de um poeta conhecido na Vela Luka!), “minha neta vai dançar ‘O homem que matou o cisne’ (leia-se “O Lago dos Cisnes”), quando então ela me perguntou “quem era o urubu”....... Vó, era o cisne negro!

Ela já estava doente há uns dois anos, mas não deixamos de tomar um susto, no dia do aniversário do meu pai, sendo que ele a havia visitado duas horas antes do óbito.

Não estou triste, mas bastante emocionada.

Sbog, baba! Obrigada por ter sido minha avó.

PS: apesar da noite passada em claro, eu queria escrever um pouco sobre o dia de ontem. Confesso, porém, que não estou nem enxergando a tela. Desculpem-me quaisquer falhas!

2 comentários:

Anônimo disse...

Oi Lu, vc nunca me viu, mas eu sou Lúcia Prizmic, meu dida Ivan Prizmic era irmão da teta Marija que faleceu aos 102 ou 103 anos,se não me engano portanto primo-irmão da teta Slava, que me viu nascer e crescer na Rua Manoel Custódio, mesma rua que O Zelão (José Gerbovic,) seus primos Maria(BOsko), casada com Laerte, e eles proprios moravam. A teta Slava, mãe do Zelão, da Silvia que nasceu na Yugoslavia, um bom tempo depois de eles terem chegado aqui no Brasil e voltado para lá (tentar) novamente a vida pós guerra. Já o Silvio nasceu no Brasil depois. Fui visitar sua baba com meu pai, quando ela já tinha se mudado para o Tatuapé,mas nem sei se ela chegou a conhecer-nos. Já não estava bem. Vc disse bem quando disse que se lembra dela rindo muito e nos fazendo rir.
Crestula, palatchinca e outros pratos comíamos sempre juntas, já meu dida, minha baba, meus tios Dunko, Margarida(Sorocaba)o Zelão conhecem:Francisca e meu pai Ivan, vieram todos de Vela Luka no mesmo navio. Até que a Danitsa(Alice) não tivesse mudado daquela casa, e depois falecido também, ia sempre lá, bem como na Rua Ana Clara, visitar suas primas e primos(Angelina, Danilo, etc). Acabamos nos encontrando, todos no enterro de meu pai e de minha mãe, e também no enterro da Danitsa e do Britso. Pena que já é difícil nos encontrarmos em lugares mais alegres, a Maria e o Laerte vivem me chamando para ir na casa deles Itupeva, mas cada um com seu trabalho e estudos fica difícil. Se vc (como eu presumo) é filha do Zelão, fui e ainda tenho fotos do casamento de seu pai e sua mãe vestidos de camponeses, um dos mais lindos casamento que já vi. A teta Slava ia muito na casa da tia Flora e da Tia Mara, em Sorocaba já que elas eram primas irmãs (tenho dezenas de festas que elas iam juntas) umas gracinhas vestidas de roupas típicas.As "meninas"(incluindo a Slava foram damas de honra da minha tia Mara), não sei se vc tem foto uma graça.. O nome de sua cuchum baba de solteira é o mesmo meu, do meu pai e do meu dida PRIZMIC, já que eram irmãos.
Fale mais vezes comigo, fiquei super feliz por ter encontrado seu blog. Meu email é l.prizmic@hotmail.com Beijos a todos (Sbog za tebe)

joaograndao disse...

Oi Lu!Muito prazer!Meu nome é João Daujotas.Sou amigo de infância do Zelão e familia e moramos muitos anos frente a frente na Rua Manoel Custódio,na mooca.Li,com um ano de atraso o seu blog sôbre a "baba Slava",muito emocionado por sinal!
Convivi com êsse pessoal muito intimamente na infância,já que minha mãe,Regina,era Yugoslava e amiga da Slava,da Alice,Dna.Maria,pois até trabalharam juntas como tecelãs.Eu particularmente lembro-me com saudades de todos.Do Britso,do Ivan,Teta Frana,Teta Lussa,barba Anton,Lavorca,Slavinho,Angelina,etcc.Lembro-me quando a Slava chamava:-"Zezinhoooooooo"vêm tomar café!O zezinho aí em questão era o Zelão e estava brincando comigo na minha casa!Ah!tempos dourados!Rua de terra,sem esgôto,água de poço.Festas juninas inesqueciveis.Fogueiras enormes!Afinal,além do Ivan(joão),tinhamos mais joãos na rua,inclusive eu.Balões cobrindo os céus.Primeiras paixonites,platônicas,pois ninguem tinha coragem de "chegar nas minas"!Bailinhos na minha casa(casa da Teta Anna).Meu Deus,que riqueza tinhamos nós,apesar de pobres!Desculpe.é como alguem disse no seu blog:Não estou enxergando o teclado!(rsrsrsrsrs)
Bem,agora vou tentar contato com a Lucia Prizmic,que participou de tudo isso que eu relatei,e muito mais.Que saudades de todos meus amigos:Zelão,Mariazinha,Silvia,Sivico,Joaozinho(irmão da mariazinha)Lucia,e a memória fraqueja.
Gostaria de agradeçer a todos a vida maravilhosa que me ajudaram a têr!
PS:Agradeço ao Zelão e a Zaide pelo cartão de Natal que me enviaram(Onde inclusive você apareçe)
Meu e-mail:Jotasonze@gmail.com
Skype jotade9 ou Orkut.
Abraços a todos!!