Um dia desses coloquei um CD no aparelho de som, Saltimbancos, e o narrador, o jumento, começou a contar sua história. Um bebê que estava na sala de casa sorriu e continuou olhando para o aparelho de som e sorrindo, enquanto o jumento falava com ele. Para um ser humano que ainda é bebê, uma voz falando com ele é apenas uma voz e não importa se ela vem da mãe, da babá, da avó ou do aparelho de som. Tudo é possível, um rádio falar ou elefante voar. Com a diferença de que um se mexe e faz barulho e outro nem tanto, um cachorro é um cachorro, tanto faz se de carne e osso ou de pelúcia.
Num outro dia desses, caminhando pelas ruas do bairro em que moro, passei por um senhor na faixa dos 70 anos e ouvi ele dizendo: mas adolescente é sempre um problema. Na hora pensei em perguntar a esse senhor se ele não se lembrava da sua adolescência, quando ele queria apenas amar e ser livre.
Não seria possível olharmos uns para os outros sem esse estranhamento, como se nós fôssemos apenas aquilo que somos no presente? Esse senhor não se tornou o que é hoje se não fosse o adolescente que foi há uns anos. E o adolescente não será assim tão diferente desse senhor aos 70 anos, por mais que ele tenha certeza do contrário.
Eu não sou o que sou se não tivesse sido uma criança que gostava da Rita Lee e que ficava olhando pelos minúsculos buracos da caixa de som na esperança de vê-la ali dentro, bem pequenininha, cantando só pra mim. Como eu disse, tanto faz se era um jumento, minha mãe ou a Rita Lee.
O que faz a diferença, isso sim, é que no fundo somos muito mais parecidos uns com os outros do que pensamos. Ou do que queremos.
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010
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